segunda-feira, 31 de outubro de 2016

CAFEÍNA – O estimulante mais consumido do mundo.


   A cafeína além de ser o estimulante mais consumido em todo o mundo, é também uma das substâncias químicas mais viciantes aos seres humanos. Exatamente por provocar dependência, isso é, vontade de consumi-la mais, a cafeína é utilizada industrialmente em diversos produtos como refrigerantes (Coca Cola, Pepsi Cola, guaranás diversos), bebidas energéticas (Red Bull, Flash Power, TNT Energy Drink, etc),  diversos chocolates, remédios para dor de cabeça, alguns tipos de balas, chás, guaraná em pó e, é claro, no café.
   Sua dose letal é de cerca de 10 gramas, algo em torno de 100 xícaras de café, algo impensável de ser ingerido por uma pessoa em um dia. A cafeína é um dos três principais alcalóides do grupo das xantinas (os outros são a teofilina encontrada nos chás e a teobromina encontrada no cacau). As xantinas são substâncias capazes de estimular o sistema nervoso, produzindo um estado de alerta de curta duração. Além de atuar sobre o sistema nervoso central, a cafeína aumenta a produção de suco gástrico. Sem nenhum valor nutricional ao organismo, sua principal função é bloquear a ação natural de um componente químico do cérebro (adenosina), associado ao sono. Bloqueando a adenosina, aumenta a excitação dos neurônios. A adenosina naturalmente dilata os vasos sanguíneos do cérebro, já a cafeína faz o contrário: os vasos sanguíneos se contraem.  Por ‘fechar’ esses vasos que a cafeína é um dos componentes de alguns remédios para dor de cabeça.
   Essa operação faz com que o organismo produza mais adrenalina, aumentando a freqüência cardíaca, concentrando o fluxo sanguíneo nos órgãos internos, dilatando a pupila, exatamente como o organismo faz quando se prepara para enfrentar uma situação de perigo.
   Assim como as anfetaminas e a cocaína, a cafeína também aumenta os níveis de dopamina no cérebro, um neurotransmissor que ativa o centro de prazer em certas partes do cérebro. Sua meia-vida no organismo é de cerca de seis horas, o que significa que, tomar uma xícara de café (que tem mais ou menos 100 mg de cafeína), as oito da manhã, faz com que as duas da tarde ainda restem 50 mg de cafeína no organismo.
   É muito comum as pessoas  consumirem uma xícara de café depois do almoço para espantar a sonolência causada por uma pesada refeição, lá pelas duas da tarde. É bom saber que essa cafeína ingerida irá continuar agindo no organismo até as duas da manhã, o que pode afetar sensivelmente a qualidade do sono. Pessoas que ingerem doses excessivas de café costumam apresentar sono pouco reparador, agitado, ou até mesmo sentir a falta dele, a insônia.
   Baixa qualidade do sono faz com que a pessoa fique sonolenta o dia inteiro. Qual a maneira de afastar a sonolência? Ingerindo mais cafeína. Está feito o círculo vicioso.
   Bebidas energéticas geralmente apresentam maior quantidade de cafeína que uma xícara de café. Nos Estados Unidos há uma bebida energética chamada “Cocaine” que possui em sua fórmula 280 mg de cafeína, quase três xícaras de café por lata.
   A ingestão de cafeína em grandes doses pode provocar efeitos negativos como irritabilidade, ansiedade, agitação, dores de cabeça, além de insônia crônica. Já a interrupção brusca no consumo, pode causar dores de cabeça, sonolência, irritabilidade, náuseas e vômitos. A cafeína não é aconselhada a quem apresente o menor sinal de arritmia cardíaca ou portadores de úlceras estomacais. Também é diurética, ou seja, aumenta a excreção urinária fazendo com que o organismo elimine mais água.
   Viciados em cafeína costumam apresentar carência de ferro no organismo (uma das causas da anemia), já que uma xícara de café é capaz de reduzir a absorção ou aproveitamento de ferro pelo organismo em cerca de  30%.
   Uma recente pesquisa realizada por psicólogos da Universidade de Durham, na Grã-Bretanha (http://bbc.in/1zSAYDS), concluiu que beber grandes quantidades de café (mais de sete xícaras de café instantâneo por dia), pode fazer com que uma sofra alucinações.
   Os pesquisadores atribuem ao fato de que o café pode levar a um aumento da produção de um hormônio chamado cortisol, substância liberada no organismo em situações de tensão e estresse.  Estudos mostraram que  uma concentração mais alta de cortisol no organismo pode fazer com que uma pessoa escute vozes não existentes.
   Quatro xícaras de café por dia aumentam em 80% a probabilidade de uma gestante ter um parto prematuro. Sete xícaras, triplica essa probabilidade.
   Mas isso não quer dizer que se deve eliminar totalmente o café de sua vida. Em pequenas doses, o café pode até ser benéfico ao organismo, porque além da cafeína, o café possui cerca de 1000 outras substâncias.
   Cientistas finlandeses e suecos divulgaram um relatório na revista médica Journal of Alzheimer’s Disease que afirma que o consumo de pequenas  quantidades de café na idade adulta pode ser eficaz no combate à evolução da demência e do mal de Alzheimer na velhice. Os estudos ainda não são conclusivos.    Os pesquisadores disseram que os resultados devem ser confirmados com outros estudos, para assim abrir a possibilidade da elaboração de uma dieta específica para combater o mal de Alzheimer.
   Mas se não quer ter problemas, o ideal é não consumir mais de quatro xícaras por dia e prestar atenção se nas outras substâncias que consome durante o dia também não tem cafeína.

segunda-feira, 24 de outubro de 2016

SAGRADO E PROFANO – A HISTÓRIA DA COCA


Planta de Coca


   A folha de coca é utilizada há centenas de anos pelos povos indígenas das florestas tropicais. Os incas atribuíam propriedades mágicas a planta que consideravam sagrada, um presente dos deuses para os homens, já que ao mascar suas folhas eles  conseguiam suportar a fome e a fadiga.  Os índios acreditavam que mascando a folha de coca entravam em contacto com deuses e espíritos que os protegeriam. Embora ainda não soubessem extrair a cocaína das folhas de coca, sabiam conservá-la misturando substâncias alcalinas à planta.
   Nos primeiros anos da colonização espanhola, a Igreja Católica condenou a coca alegando que o ritual de seu uso era bruxaria e corrompiam as populações nativas. Mas como a folha de coca se mostrou um excelente estimulante que permitia aos índios executar trabalhos pesados sem sentir cansaço, fome e sede, os espanhóis toleravam seu uso. A primeira citação científica da planta só foi escrita em 1708 pelo médico, químico e professor holandês Herman Boerhaave, na revista Institutiones Medicae. No começo do século XIX a coca caía nas graças de destacados botânicos, farmacologistas e médicos que a descreviam como “saudável e condutora da longevidade“, “evocadora da potência do organismo, sem deixar sinal algum de debilidade conseqüente“, entre outros comentários efusivos.
   Mas foi só quando o químico alemão Albert Niemann (1834–1861), recebeu do naturalista austríaco Carl Von Scherzer uma amostra de folhas de coca que trouxe de uma viagem ao Peru, que o princípio ativo da folha de coca foi isolado. Foi Niemann que batizou a substância de ‘cocaína’  em 1860. Como se mostrou um poderoso anestésico local, chegou a ser utilizado como medicamento para diversos fins até o início do século XX.
   Vários produtos comerciais utilizaram folhas de coca. Em 1863 o empresário italiano Angelo Mariani desenvolveu o vinho de coca onde seu anúncio dizia que “nutria, fortificava e refrescava a mente e o corpo”. O Vinho Mariani logo foi um sucesso. Era consumido principalmente por artistas e escritores, mas também pela Rainha Victoria, por William McKinley (25º presidente dos Estados Unidos), por Thomas Edison e até pelo Papa Leão XIII que chegou a conceder ao Vinho Mariani um selo oficial de aprovação e uma medalha de ouro ao seu criador.
   Em 1885, o farmacêutico John Pemberton veterano da Guerra Civil Americana, procurava algum remédio que o livrasse do seu vício de morfina contraído em batalha. Criou um tônico à base de folha de coca e noz-de-cola. Quando provou o xarope, sentiu imediatamente alivio às suas dores de cabeça, um dos sintomas de abstinência de morfina.  Resolveu colocar seu tônico para vender em uma farmácia. Ao perceber que as pessoas passaram a consumir seu produto indiscriminadamente, Pamberton fez leves alterações na receita e fez de sua bebida um ‘Vinho de Coca’ como o Mariani, para ser apreciado nas lanchonetes. O nome original era Pemberton’s French Wine Coca. Pouco depois o produto ganhou o nome que tem até hoje: Coca-Cola.
Vinho Mariani em anúncio do final do século XIX
   A título de estudar os efeitos sobre a cocaína, dois laboratórios, Merck (a partir de 1862) e Parke Davis (a partir de 1870), passaram a comercializar a cocaína em forma de óleos, inaladores, sprays nasais, vinhos e cigarros, e distribuíam a substância para alguns especialistas realizarem pesquisas.
   Um deles era nada menos que o pai da psicanálise, Sigmund Freud.
   Em 1884 Freud publicou o artigo “Über Coca”, onde relatava a história de sua utilização na América do Sul, seus efeitos e suas diversas utilizações terapêuticas. Freud relatava a capacidade da substância de exaltar o humor, aliviar transtornos gástricos, caquexia e a asma, além de suas propriedades afrodisíacas e seu possível uso como anestésico local. Ele mesmo fazia uso de cocaína constantemente e considerava improvável a existência de uma dose letal para essa droga.
   Mas o que os laboratórios queriam era encontrar uma nova droga que livrasse as pessoas do vício de morfina, e Freud acreditou que essa droga poderia ser a cocaína.  Por isso estimulou diversos colegas a utilizarem cocaína, como o oftalmologista vienense Carl Koller, que injetou como anestésico local em uma cirurgia em um paciente com glaucoma. A cocaína foi o primeiro anestésico local a ser utilizado em cirurgias.
   Após essa descoberta, a cocaína foi utilizada em cirurgias oculares, dentárias e auditivas.
   As principais revistas médicas da Europa e dos Estados Unidos da época, incentivavam seu uso como estimulante e para “deixar as damas plenas de vivacidade e charme“.
   Um dos primeiros dissabores de Freud com a cocaína veio de seu amigo Dr. Ernst von Fleischl Marxow que utilizava a droga como alternativa à sua dependência de morfina (adquirida após ele ter amputado uma perna), por sugestão do próprio Freud. Com a grande quantidade que Fleischl passou a ingerir, ele desenvolveu um quadro de psicose paranóide intratável.
   Por volta de 1890 já havia cerca de 400 casos de danos físicos e psíquicos relacionados à cocaína publicados na literatura médica. A comunidade científica acusou Freud de dar vazão a terceira praga da humanidade – depois do álcool e da morfina – chamando-o de irresponsável, o que o obrigou posteriormente, a revisar seu estudo sobre a substância.
   Em 1901 a Coca-Cola retirou a cocaína de sua fórmula, passando a utilizar extrato de folha descocainizada de coca, o que fazem até hoje.  Mesmo assim, em 1909 ainda haviam nos Estados Unidos mais de 60 tipos de bebidas que continham cocaína em sua fórmula.
   Com a entrada em vigor da Lei Seca, John Pemberton substituiu o álcool da fórmula da Coca Cola por noz de cola e gaseificou a água, fazendo um produto semelhante ao que é consumido hoje.
   Com o aumento dos casos de pessoas apresentando quadros psicóticos e depressivos, além de insônia e vício em cocaína, as comunidades científicas passaram a criticar a venda da cocaína pela indústria farmacêutica, afirmando que esses haviam promovido a substância de uma maneira irresponsável e não-científica. As mesmas comunidades aliás, que no início só ressaltavam as qualidades da nova droga.
   A partir daí a cocaína caiu em desuso pela classe médica até ser definitivamente proibida por leis norte-americanas, seguida pelos demais países.